Tecnologias exóticas

De motores com cilindros ovais a quadros que servem como reservatório de combustível, conheça algumas tecnologias desenvolvidas para alcançar grande desempenho nas pistas de competição e inovação no mercado de motocicletas

Motor de 250 cm³ com 6 cilindros

Em 1966 a equipe Honda tinha uma tarefa difícil a cumprir: competir no Mundial das 250 cm³, mas seguindo os preceitos de Soichiro Honda, utilizando uma moto 4 tempos. Mas como fazer uma moto de 4 tempos ser tão competitiva quanto as motos de 2 tempos das equipes rivias? A solução dos engenheiros da Honda, foi desenvolver um motor com as 250 cm³ do regulamento com 6 cilindros em linha que alcançava incríveis 18.000 rpm atingindo os 62 hp de potência. O motor era uma pequena jóia de precisão: cada cilindro tinha apenas 41,6 cm³, o virabrequim era composto por 13 peças separadas, cada uma delas menor que uma peça de dominó e deveriam ser manuseadas com cuidado pois poderiam ser entortadas com as mãos. A potência específica era de 248 hp por litro (a superesportiva Ducati 1299 Panigale alcança "apenas" 159,5 hp por litro). O motor de seis cilindros era mais estreito que os bicilíndricos 2 tempos das rivais, e a moto pesava apenas 116 kg.

E a pequena engenhoca dos japoneses funcionou? Bem, nas mãos de Mike Hailwood, a pequena RC166 venceu as 10 corridas da temporada de 1966 conquistando o campenato de pilotos e construtores, ganhando também na temporada seguinte. Em 1967, a FIM restringiu o número de cilindros para 2 nas 250 cm³ e 4 nas 500 cm³, fazendo com que a RC166 não se enquadrasse mais nas normas da competição. Esta estratégia de utilizar altos giros no motor para alcançar alto desempenhos só voltou a ser utilizada nos anos 1990 pela Fórmula 1.

Cilindros ovais

Era o fim dos anos 1970, e mais uma vez, a Honda deveria competir no Mundial de Velocidade utilizando um motor de 4 tempos contra as motos 2 tempos das rivais. Mas com a restrição de 1967, a Honda não poderia competir nas 500 cm³ com mais do que 4 cilindros. Desta vez, os engenheiros optaram por uma solução inédita: criaram um motor V8, onde as câmaras de combustão seriam interligadas em pares, fazendo com que na prática o motor tivesse 4 câmaras de combustão, respeitando o regulamento.

Além do motor com cilindros ovais com 32 válvulas, a NR500 utilizava um quadro monocoque que envolvia o motor, diminuindo o arrasto aerodinâmico, rodas de 16 polegadas que diminuiam o efeito giroscópico e aumentavam a agilidade nas mudanças de direção. Mas após um difícil período de desenvolvimento, a NR 500 foi colocada nas pistas prematuramente, estreando no GP da Inglaterra de 1979, pilotada por Mick Grant que caiu na quarta volta após o motor jogar óleo na roda traseira, e pelo japonês Takazumi Katayama que abandonou na sétima volta com problemas de ignição quando estava no segundo lugar. A Honda insistiu no projeto por mais duas temporadas mas abandonando o quadro monocoque, que dificultava reparos no motor durante as corridas, e as rodas de 16 polegadas foram substituídas por aros 18 convencionais. Até que em 1981 a Honda deu o braço a torcer e projetou a NS 500 com um motor 2 tempos, que lhe deu seu primeiro título das 500 cm³ em 1983.

Apesar deste primeiro fracasso, a Honda criou a NR 750 com cilindros ovais para provas de endurance durante os anos 1980. Em 1992, a Honda comercializou 300 unidades numa versão de rua a 50 mil dólares cada, o que fazia da Honda NR 750, a moto de produção mais cara da época.

Suspensão RADD

Em 1993, a Yamaha lançou a GTS 1000, derivada do protótipo Morpho de 1991. A GTS era uma sport touring que se destacava pela suspensão dianteira do tipo RADD, projetada por James Parker onde as bengalas convencionais são substituídas por um único braço oscilante horizontal ligado ao motor. Tecnicamente o sistema garantia mais estabilidade durante frenagens, mas que comercialmente não justificava o alto preço cobrado pela moto, o que a fez sair de linha em 1994 sendo substituída pela FJ 1300. Além da suspensão diferenciada, a GTS era equipada com injeção eletrônica e freios ABS, itens raros até mesmo nos carros da época. Hoje é item de colecionadores.

O quadro-tanque de Buell

No início dos anos 1980, o engenheiro Erick Buell iniciou a fabricação de suas motos, seguindo o conceito de centralização de massas para um melhor desempenho dinâmico da moto. Um dos produtos deste conceito, foi um quadro que tinha também a função de armazenar o combustível, fazendo com que a massa deste ficasse distribuída de forma uniforme, contribuindo para um centro de gravidade mais baixo garantindo melhor comportamento dinâmico.

O freio perimetral

Outra inovação de Erick Buell, foi o freio ZTL (Zero Torsional Load), onde os tradicionais discos duplos montados junto ao cubo, foram substituídos por um único disco montado no perímetro da roda, com um único caliper. Segundo Abraham Askenazi, isto se traduz num peso 30% menor em relação aos sistemas tradicionais de dois díscos utilizados em motos similares, permitindo um trabalho mais eficiente da suspensão dianteira com menor massa suspensa.

Ram air

Utilizado inicialmente na aviação a partir da década de 1940 e nos automóveis de alto desempenho nos anos 1960, o conceito ram air consiste em utilizar a pressão dinâmica do ar criada pelo movimento do veículo para aumentar a pressão estática dentro do coletor da câmara de combustão. Em outras palavras, com maior fluxo de ar a capacidade volumétrica é aumentada, ganhando certo percentual de potência em altas velocidades.

A primeira motocicleta de produção a utilizar o ram-air foi a Kawasaki Ninja ZX-11 de 1990 (ZZ-R 1100 na Europa).

Comando desmodrômico

Nos comandos de válvulas tradicionais, as válvulas são abertas por cames e fechadas por molas de retorno. Em altas rotações, a mola pode perder a capacidade de acompanhar o ritmo do motor e não retornar a válvula no tempo certo (flutuação de válvulas), onde em casos mais severos, o pistão colide com a válvula e ocasiona a quebra do motor. Há também o problema da válvula não estar completamente fechada quando a próxima combustão esteja ocorrendo, ocasionando escape prematuro de gases e queda no rendimento do motor. A solução dos fabricantes tem sido aumentar a tensão da mola o que faz com que as válvulas sejam fechadas mais rapidamente, mas por outro lado, estas molas com maior tensão exigem maior esforço do motor para abrir as válvulas e geram mais fricção e calor durante seu funcionamento.

No sistema desmodrômico, cada válvula é aberta e fechada por um conjunto de cames e balancins. A vantagem do sistema desmodrômico é evitar a flutuação de válvulas em altas rotações, pois não depende da força de retorno de uma mola, mas opera a abertura e fechamento das válvulas pela massa das próprias peças móveis. A desvantagem é o desgaste nos pontos de contato entre os cames e balancins e a necessidade de ajustes de válvulas periódicos, já que o comando desmodrômico não permite ajustadores hidráulicos de válvulas. O sistema de comando desmodrômico foi mencionado em patentes pela primeira vez em 1856 por Gustav Mees. O sistema foi adotado nas motos quando em 1956, o engenheiro italiano Fabio Taglioni projetou um comando de válvulas desmodrômico para a Ducati 125 Grand Prix, criando a Ducati 125 Desmo. Este sistema está presente até hoje nas motocicletas Ducati.

Válvula YPVS

Uma das características negativas dos motores 2 tempos, é o baixo desempenho em baixas rotações. Várias soluções foram buscadas pelos fabricantes, entre eles o YPVS (Yamaha Power Valve System) da Yamaha que consistia em numa válvula que mudava a altura e diâmetro da saída de escape de acordo com as rotações do motor, o que otimizava a potência e torque em todas as faixas de aceleração. A válvula tem o formato de uma palheta oval e sua abertura é controlada por um servo-motor que recebe informações de uma controladora no CDI, começando a atuar gradualmente entre 3 e 6 mil rpms para desempenhos médios e abrindo totalmente a partir de 6 mil rpms para potência total. Houve versões mecânicas, mas a Yamaha sempre utilizou o YPVS em seus motores com refrigeração líquida.

Virabrequim crossplane

A tecnologia de virabrequim crossplane (plano em cruz) começou a ser utilizada nos motores V8 norte-americanos, onde as manivelas do virabrequim formam ângulos de 90º entre si, enquanto no flatplane, formam ângulos de 180º. Num motor flatplane os quatro cilindros em linha tem tempo de explosão diferentes, onde a cada ciclo (volta do virabrequim) dois cilindros "explodem" e no próximo ciclo os outros dois. No sistema crossplane, a disposição das manivelas do virabrequim, permitem que os quatro cilindros explodam no mesmo ciclo, cada um atuando a cada 90º ou 1/4 de volta do virabrequim, gerando uma grande explosão (daí o apelido big bang). Outra característica é que o segundo ciclo do giro do motor fica sem explosão, fazendo com que o pneu traseiro se recomponha e tenha aderência para que no próximo ciclo haja outra grande explosão. O resultado é um motor com respostas mais "violentos" ao acelerador e um som mais irregular no escapamento. Entre os fabricantes de motocicletas, a Yamaha foi a primeira a utilizar na YZR M1 de Valentino Rossi na MotoGP e implementou nas YZF R1 de rua a partir de 2009.


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